A reforma trabalhista brasileira: para além do óbvio
Qual
o limite das maquinações governamentais para a vida da população
em geral? Qual o sentido mais oculto de discursos que defendem a
necessidade de “arrocho” das finanças públicas? Qual o objetivo
de uma legislação trabalhista e previdenciária que desconsidera a
vontade popular para que a vontade de um governo se sobreponha como
certa ou como a única ou como a melhor?
A
atual situação da política brasileira, eivada de representantes
moralmente não dignos de suas cadeiras no poder executivo e no
legislativo é um exemplo do que não deve ser replicado por quem
espera por uma sociedade democrática, justa e ordeira.
O
mesmo governo que propõe mudanças radicais é o governo erguido por
razões inglórias. Afinal, como pode uma equipe ser composta por
culpados e por isentos? Como pode uma chapa eleita ser composta por
uma presidente julgada não merecedora de seu cargo e por um vice
“decorativo”?
A
reforma trabalhista que aumenta o tempo de cotribuição e a idade
mínima de aposentadoria é um retrocesso para um país em que o
trabalhador e a trabalhadora recebem um salário mínimo de miséria.
Essa reforma trabalhista costurada às custas de jantares no palácio
do Jaburu não é suficiente para ajudar a população mais
empobrecida. Em vez de acabar privilégios da elite política,
empresarial e bancária do país, a reforma mascara o grande fosso
que está se alargando entre uma minoria que conseguiu escapar dos
efeitos da crise e uma maioria que sobrevive de migalhas.
Tal
(ultrajante) reforma não é suficiente para fazer o país adentrar
em um ciclo de crescimento porque onera o trabalhador bem como não
traz competitividade ou agilidade para o cenário brasileiro diante
do mercado globalizado nem promove distribuição de renda.
A
reforma trabalhista proposta de maneira açodada por um governo e um
partido jamais eleitos democraticamente pelo voto direto da população
não acaba com o problema da alta carga tributária, com o fantasma
da corrupção, com as chagas promovidas pela ingerência do bem
público.
Quando
um político ou um técnico afirma que a reforma é boa para as
futuras gerações, esquece de computar o fato de que um país
continental como o Brasil é composto por sujeitos inseridos em
realidades múltiplas. O carvoeiro, o agricultor que lida com veneno
em suas plantações, a doméstica, o vendedor ambulante,
otrabalhador informal e uma centena de outros trabalhadores,o
topiqueiro e o motorista que enfrenta a criminalidade das ruas e
estradas, a dona de casa que sustenta filhos e maridos com seu
trabalho de formiguinha, o professor que trabalha com uma centena de
corações e de histórias de vida… Há uma centena de sujeitos que
não chegam aos 60 anos de idade com saúde nem com acesso digno e
regular aos serviços públicos que necessitam.
A
reforma trabalhista proposta pelo atual governo estabelecido de forma
legal (mas ilegítima) não é suficiente para combater os malefícios
de uma longa e profunda crise econômica e político-partidária que
agravou a informalidade no mercado de trabalho, machucou as
aspirações econômicas e financeiras dos mais empobrecidos, reduziu
a renda de trabalhadores e empregados e que trouxe novas formas de
pobreza para a casa dos cidadãos.
O
relator da reforma trabalhista proposta pelo (ilegítimo) governo
atual estrategicamente defende a necessidade de mudanças, mas ele
evita seguir os bons exemplos de países mais desenvolvidos. Ora, a
reforma trabalhista não vem para permitir ao trabalhador o acesso
aos teatros, aos cinemas, à vida cultural e às oportunidades que
permitem o processo de sogiogênese do qual resulta o ser humano como
um sujeito social e singular de fato e de direito.
Essa
reforma é um crime hediondo aos que hoje trabalham e aos que lutaram
no passado pelo trabalhador e pela trabalhadora do Brasil. Ela não
aumenta o ganho salarial do trabalhador nem, tampouco, lhe garante
uma aposentadoria capaz de suprir gastos com a saúde de um corpo que
envelhece e que se torna propenso ao colesterol, ao diabetes, ao
reumatismo e a todo um conjunto de situações que demandam
profissionais (fisioterapeutas, psicólogos, dentistas e outros),
remédios e novas oportunidades para uma população historicamente
combalida em seus direitos e garantias.
E
afinal, quem é o trabalhador brasileiro? É o sujeito que acorda de
madrugada para atravessar a cidade de São Paulo com seu trânsito
caótico, com seu transporte público deficitário (e repleto de
tristes casos de abuso sexual, roubos e falhas). É o sertanejo que
trabalha numa terra arrendada à espera da chuva e de um milagre para
as pragas não destruírem seu roçado. É o homem dos pampas que
enfrenta as geadas, o ribeirinho que sofre com o assoreamento dos
cursos de água provocados pelas grandes obras públicas e/ou
privadas. É o sujeito que tem sonhos para sua família, mas que não
tem formação técnica e/ou acadêmica suficiente e contínua. É
aquele que se sujeita a uma jornada de trabalho maior do que o que o
relógio de ponto registra oficialmente. É aquele sujeito que
enfrenta as filas do SUS ou que se sujeita em mendingar a ajuda
oportunista de políticos em busca de soluções para suas dores
crônicas ou agudas.
E
agora? O que a reforma trabalhista brasileira pode fazer por nós.
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